Nesse livro, Notice sur la vie et les ouvrages de Auguste Bébian, publicado em 1839, no mesmo ano em que morreu Auguste Bébian, Berthier pretende prestar sua homenagem ao professor ouvinte fluente em Língua Francesa de Sinais e o primeiro a publicar estudos gramaticais sobre essa língua (Mimographie, 1925).
Lembrando que em 1834 teve lugar o primeiro BANQUETE SURDO em Paris, percebemos que Berthier, além de reverenciar a memória de Bébian, mantém sua luta em defesa dos surdos e da sua Língua de Sinais. Até mesmo pelo fato que Bébian era um estudioso e admirador dessa língua, nada mais apropriado para a divulgação das suas qualidades intrínsecas.
Enquanto que no livro anteriormente publicado, Historie e statistique de l´éducation des sourds-muets, pudemos encontrar algumas menções ao sentido de comunidade dos surdos (a recorrência de palavras como “irmãos”, “companheiros de infortúnio”), nesse material Berthier foca na defesa da Língua de Sinais, inspirado, evidentemente pelo próprio homenageado.
“Para grande surpresa de quem assistia às aulas, ele revelou sem esforço toda a riqueza, toda a flexibilidade, toda a energia de que a língua dos surdos-mudos apresenta. É graças a essa ação que pudemos, pobres crianças carentes, superar as maiores dificuldades de estudo, podendo saborear nossos melhores escritores, traduzir adequadamente todos os autores franceses e estrangeiros. (...) 'Abandone', ele dizia, 'o velho homem, isto é, o homem oralizado, então concebe claramente o teu pensamento e não deixará de encontrar Sinais para o exprimir.'” p. 8
Nas páginas seguintes, o autor relata uma das “aulas abertas” que eram realizadas no INJS, demonstrando a capacidade de a Língua de Sinais não só entender conceitos filosóficos sofisticados, mas sempre destacando a beleza dessa língua.
Em 1817 Bébien publica seu Essai sur les sourds-muets et sur le langage naturel, ou Introduction à une classification naturelle des idées avec leur signes propres. Segundo Berthier,
“Nunca um livro revelou uma compreensão tão perfeita da natureza, da mente e do coração dos surdos-mudos.” p. 11
É interessante que Berthier, mesmo na defesa da Língua de Sinais, traz elementos da defesa do que chamaríamos atualmente de Cultura Surda. O que vejo claramente como a defesa da existência de um “povo surdo”, que representa e se representa nessa língua a todo tempo valorizada.
A obra mais importante de Bébien foi, sem dúvida nenhuma, o Mimographie, de 1925, onde o professor busca “estabelecer um sistema regular e uniforme de sinais (...) e escrever todos os signos imagináveis com um pequeno número de caracteres; acrescentando pontos fisionômicos (correspondentes aos nossos pontos de exclamação e ponto de interrogação)” p.12/13. O trabalho de Bébien poderia ser associado ao que atualmente denominamos escrita de sinais ou escrita de língua de sinais. Na realidade, o objetivo do autor, além de fazer um levantamento linguístico da língua era documentar a mesma em uma época que os recursos de imagens em movimento ainda não existiam. E, claro, validar essa língua como completa e funcional como qualquer outra língua oral existente.
“Um dicionário de signos mimográficos não ofereceria, sem dúvida, menos vantagens aos professores do que aos alunos; alguns encontrariam ali os signos naturais das ideias, e outros o significado das palavras, como as crianças do ensino médio encontram em um dicionário, ao lado das palavras francesas correspondentes, o significado de palavras latinas ou gregas que não conhecem. Assim, o mais ignorante surdo-mudo poderia aprender em oito ou dez dias a pintar seu pensamento no papel, sem a necessidade de traduzi-lo preliminarmente para nenhuma língua. " p.13
Bébien, na opinião de Berthier, poderia ser considerado um “novo” pai dos surdos, como o fora Abée de l´Épée. E o livro irá recontar a história da vida e da luta daquele ouvinte com “alma surda”, falante bilíngue de Francês e Língua de Sinais. Para nosso estudo, fica a certeza que existia na época um movimento bem articulado de defesa da Língua de Sinais e do que podemos reconhecer como “cultura surda”.
Ao relatar um famoso episódio de 1832, quando os professores surdos do Instituto e a direção tiveram um embate a respeito da oralização em detrimento do uso do Sinais na educação dos surdos, Berthier destaca que “a língua gestual, essa língua admirável, universal e sem rival, é e deve ser a principal intérprete de sua inteligência. Este é o julgamento feito pelas autoridades mais sérias em tal assunto. Setenta anos de experiência existem para atestar a superioridade incontestável e indiscutível do sistema que fundamenta o ensino de surdos na língua que Deus nos deu.” p.33
Confira o livro Notice sur la vie et les ouvrages de Auguste Bébian e boa leitura!
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